
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Na longa história de intervenções dos Estados Unidos contra países da América Latina, houve mobilizações militares grandes, mas nada na escala de poder de fogo que Donald Trump ordenou para tentar derrubar o ditador Nicolás Maduro na Venezuela.
O poderio aeronaval deslocado para o Caribe é o maior já visto na região. Hoje, só de mísseis de cruzeiro Tomahawk para uma improvável salva única, há cerca de 250 unidades em nove embarcações armadas com eles que operam na área até esta quarta-feira (17).
Em comparação, no primeiro dia do ataque a Bagdá na guerra de 2003, Washington despejou estimados 40 Tomahawks sobre a capital iraquiana. E aqui só se fala deste simbólico armamento: há muito mais rondando Caracas.
Só do maior porta-aviões do mundo, o USS Gerald Ford, podem voar até 65 aviões de ataque F/A-18 Super Hornet, cada um com até oito toneladas de carga bélica a cada decolagem. O gigante chegou no mês passado ao teatro de operações do Caribe, e são realizadas missões diárias de seus aviões, uma frota total de até 90 aparelhos.
Trump também enviou bombardeiros de longo alcance B-52 e B1-B para lamber o espaço aéreo venezuelano em algumas ocasiões. Cada avião desses pode lançar de 20 a 24 mísseis de cruzeiro ar-terra por missão.
Também foram levados ao Caribe dez caças avançados F-35C da Marinha, frota que está sendo reforçada com algo entre cinco a dez modelos F-35A da Força Aérea, que têm mais capacidade de carga. Eles estão estacionados na base reaberta em Porto Rico, ilha americana na região.
Essas ações servem para intimidar e para testar as capacidades de defesa de Maduro, que possui baterias antiaéreas relativamente sofisticadas, como as S-300 russas, e material mais antigo. Uma ameaça para a frota americana são os mísseis antinavio russos, chineses e iranianos de que o ditador dispõe.
Contra tudo isso, foi reforçado o componente de guerra eletrônica americano. Aos cerca de cinco EA-18G Growler que o Ford transporta foram adicionados ao menos outros seis desses caças em Porto Rico.
Eles servem para interferir no funcionamento de radares e proteger aviões e mísseis de cruzeiro em um ataque. Para cobrir com maior precisão a região, o Corpo de Fuzileiros Navais instalou em outubro um dos 60 G/ATOR que comprou na ilha de Trinidad e Tobago, junto à costa venezuelana.
Trata-se de um radar de detecção de alvos e ameaças em um raio de até 740 km, específico para cenários de guerra expedicionária por ser de fácil transporte -há um grupo com três navios e quase 3.500 fuzileiros navais e 1.900 marinheiros há meses treinando no Caribe. São a ponta de lança de um efetivo de cerca de 15 mil militares, a maioria da Marinha, quase 5.000 só no Ford.
A desculpa para a instalação é a mesma dada no Pentágono para a chamada Operação Lança do Sul: combater o narcotráfico na região, o que vem até aqui sendo demonstrado por ataques com drones e até um “tanque voador” AC-130J Ghostrider baseado em El Salvador.
As ações contra pequenos barcos, questionadas no Congresso dos EUA, já mataram quase cem pessoas. Mas Trump não mede palavras em sua pressão sobre Maduro, de quem disse que os dias estavam contados, apreendeu um petroleiro e determinou um bloqueio a navios sob sanção.
A variedade de ativos ofensivos abre um leque de opções. A mais evidente é a de ataques pontuais contra instalações do regime e das Forças Armadas, suprimindo a defesa aérea, restando saber se haveria um componente por terra.
Este poderia ser uma ação de forças especiais visando matar ou prender Maduro e ocupar pontos estratégicos do país, como infraestrutura energética e aeroportuária. Mas a Venezuela é grande e, se houvesse resistência, seria na forma de guerrilha.
Já uma invasão terrestre mais ampla não parece estar no cardápio pelo número de homens mobilizados. Nas duas mais recentes incursões para derrubar adversários, havia menos canhões, mas mais soldados.
Em 1983, a ilhota de Granada, então com 95 mil habitantes, viu cerca de 7.500 soldados americanos e de outros países vizinhos operando para tirar um governo pró-soviético do poder. Os recursos aeronavais foram grandes: um porta-aviões, três destróieres, duas fragatas e dois navios de assalto anfíbio.
A Venezuela tem 28,5 milhões de habitantes, mas em favor da lógica de uma ação há o fastio dessa população com a ditadura de Maduro. Talvez os atuais estrategistas nos EUA acreditem ser possível virar a mesa sem uma ocupação de fato.
Em 1989, quando derrubaram o ex-aliado Manuel Noriega no Panamá, então com 2,4 milhões de pessoas, os EUA usaram 300 aviões. Por terra, chegaram 27 mil soldados.
Na mais recente ação de grande porte, autorizada pela ONU para restaurar o governo eleito no Haiti em 1994, os EUA mobilizaram 25 mil soldados para agir no país que tinha 7,4 milhões de habitantes. Dois porta-aviões participaram do cerco, embora um fosse o antigo USS America, que seria aposentado dois anos depois.
Os golpistas haitianos se renderam sem confronto, e havia apoio internacional: três corvetas argentinas e uma fragata holandesa participaram das manobras.
A linha do tempo de intervenções americanas a partir da Doutrina Monroe de domínio hemisférico, de 1823, inclui guerras, como no México, e apoio a golpes, como no Brasil.
Trump declarou, em sua nova Estratégia de Segurança Nacional, estar disposto a reativar a política de uso da força na região, e Maduro é seu primeiro alvo -para temor dos vizinhos, ainda que desprezem a ditadura venezuelana.
Fonte:Notícias ao minuto


